*O Juramento Árabe...*

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Baçus, mulher de Ali, pastora de camelas,
Viu de noite, ao fulgor das rútilas estrelas,
Vail, chefe minaz de bárbara pujança,
Matar-lhe um animal. Baçus jurou vingança,
Corre, célere voa, entra na tenda e conta
A um hóspede de Ali a grave e inulta afronta.

“Baçus, disse tranquilo o hóspede gentil.
Vingar-te-ei com meu braço, eu matarei Vail”.

Disse e cumpriu.
Foi esta a causa verdadeira
Da guerra pertinaz, horrível, carniceira
Que as tribos dividiu. Na luta fratricida,
Omar, filho de Anru, perdera o alento e a vida.

Anru, que lanças mil aos rudes prélios leva,
E que em sangue inimigo, irado, os ódios ceva.
Incansável procura – e é sempre em balde – o vil
Matador de seu filho, o tredo Mualhil
Uma noite, na tenda, a um moço prisioneiro,
Recém-colhido em campo, o indómito guerreiro
Falou, severo, assim:
“Escravo, atende e escuta:
Aponta-me a região, o monte, o plaino, a gruta,
Em que vive o traidor Mualhil, diz a verdade;
Dá-me que o alcance vivo, e é tua a liberdade!”

E o moço perguntou:
“É por Alá que o juras?”
“Juro” – o chefe tornou.
“Sou o homem que procuras!
Mualhil é o meu nome, eu fui que espedacei
A lança de teu filho e aos pés o subjuguei!”
E, intrépido, fitava o atónito inimigo.
Anru volveu: “És livre, Alá seja contigo!”

Gonçalves Crespo in “Nocturno”

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*O Que Nos Divide*

Imaginemos que toda a gente tinha a mesma política, religião, etc. Nem por isso se viveria mais em paz.
Porque logo se descobririam diferenças naquilo que a todos unia.
E paralelamente surgiriam as discordâncias, invejas e ódios subsequentes.
Porque não é a ideologia que no fim de contas divide.
A ideologia é apenas um bom pretexto.
O que nos divide é a importância da nossa pessoa e o grupo extensivo a que nos recolhemos.
O que nos divide é a individualidade que não tem misturas ou só as tem com quem prolongar a pessoa que somos.

Virgilio Ferreira , in 'Conta-Corrente IV'
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*Nem Excelênte Nem Absoluto*

Todo o Excelênte merece o ostracismo. É um bem, se ele a si próprio se condenar. Todo o Absoluto deve ser banido do mundo. No Mundo tem de se viver com o Mundo. E só se vive, se for no sentido dos Homens com os quais se vive. Todo o bem que há no Mundo provém do interior (e portanto vem-lhe a ele do exterior), mas é apenas uma faísca que, veloz, o percorre. Todo o Excelente faz avançar o Mundo, mas deve desaparecer quanto antes.

Friedrich Von Novalis , in "Fragmentos"

(*)
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